quarta-feira, 28 de julho de 2010

Saudade deslocada


O que eu faço com essa saudade? Eu posso afogá-la no mar da tristeza e enterrar a sua carcaça na beira desse mar de maré imprevisível. Isso não seria sensato, pois frequentemente precisamos cuidar da barragem pra esse mar não inundar a cidade da nossa vida.
A maré violenta subverteria a carcaça, a bateria na barreira frágil, que só suporta a força das águas obscuras, transtornando a barragem e converteria em lago a cidade.É, isso não daria certo. Eu poderia também colocar a saudade junto das contentes crianças com nome alegria, no seu orfanato florido e feliz, que fica no coração da cidade. Mas essas crianças tão teimosas não gostam de indivíduos estranhos na sua morada de bem-aventurados, então jogaria a saudade pra se perder na cidade. Essa saudade ficaria revoltada e causaria uma onda de crimes. Então a corporação policial, a chamada consciência, prenderia a saudade na prisão, com o nome de desespero. Toda a cidade, pacífica e curiosa cidade, daria a atenção para essa forasteira, provocando uma desordem na rotina primorosa causando um efeito dominó, destruindo e falindo tudo o que há ali. É, isso também não daria certo. Outra opção seria colocar essa saudade no covil de malfeitores, como o da ira. A ira, muito persuasiva, convenceria a saudade a levar toda a cidade (e também as cidades vizinhas) à raiva. E a raiva transformaria tudo em sombra, e tudo que é resto viraria escravo. Provavelmente isso não daria certo. Em todas essas instituições há a possibilidade dessa saudade entrar, por mais que não saia uma coisa boa, há a possibilidade de entrar. Mas no porão do esquecimento a saudade não entra, o esquecimento não admite, e não tem espaço, para esse tipo de saudade tão forte, obstinada e grande. Então a solução para esse problema, talvez seja, construir uma casa, triste e solitária casa, para abrigar esse mendigo infortúnio, torná-lo civilizado e obrigar o resto da cidade a conviver com essa desgraça que, pouco a pouco, corrói toda a burocracia da pequena e complicada cidade com o nome de minha vida.

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